Fernando Pessoa
Símbolo primeiro do Chiado nos dias de hoje é sem dúvida Fernando Pessoa. É ver os turistas a fazerem fila para se deixarem retratar com a sua figura em bronze, da autoria de Lagoa Henriques, à porta de “A Brasileira”.
Fernando Pessoa nasceu a 13 de junho em 1888, no Largo de São Carlos, no nº4, 4º andar esquerdo. O signo astrológico de Gémeos pareceu prenunciar a multiplicação de personagens, evidenciada nos heterónimos, entre os quais se destacam Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis, nascidos no dia triunfal de 8 de março de 1914, além do meio ortónimo Bernardo Soares…
Tendo como epicentro o Chiado, os roteiros de Pessoa na cidade são infindáveis em “passo sempre errante” – desde a Rua dos Douradores, a Rua do Ouro, a Praça da Figueira, “A Brasileira”, a Praça do Comércio, até Campo de Ourique, à rua Coelho da Rocha, onde hoje se situa a sua Casa Museu. E aqui mesmo, no coração do Chiado, ouvimos o poema: “Ó sino da minha aldeia / Dolente na tarde calma / Cada tua badalada / Soa dentro da minha alma.”, inspirado pelo campanário da Basílica dos Mártires, omnipresente para quem morava no largo de São Carlos. “A cada pancada tua, / Vibrante no céu aberto, / Sinto mais longe o passado, / Sinto a saudade mais perto” (1913). A Basílica dos Mártires data inicialmente do ano de 1147, na altura erguida no alto da colina de São Francisco. Destruída pelo Terramoto de 1755, foi sob a responsabilidade do arquiteto Reinaldo Manuel dos Santos, que em 1769 se iniciou a sua construção. Benzida em 1774, somente abriria ao culto em 1786.
A cidade entusiasma Fernando Pessoa, que não deixa de ser crítico do desinteresse de algumas praças algo tristes. Álvaro de Campos di-lo num de três sonetos: “Praça da Figueira de Manhã” (…) “Há tanta coisa mais interessante/Que aquele lugar lógico e plebeu”. E se falamos de Chiado, não esquecemos o São Carlos, que foi desde que nasceu, e enquanto esteve em Lisboa, uma referência essencial para o poeta, construído pelo impulso do Intendente Diogo Inácio de Pina Manique, com o traço de José da Costa e Silva e com a inspiração do Teatro alla Scala de Milão… Mais adiante está “A Brasileira”, com projeto do Arquiteto Norte Júnior. Na fachada há três portas envidraçadas encimadas por uma escultura em estuque, envolvida por motivos vegetalistas, representando uma figura masculina a beber café. No interior, um balcão à direita percorre todo o corredor e, do lado oposto, estão as mesas de tampo de mármore. Nas paredes, encontram-se diversas obras de pintores como Manuel Baptista, Hogan, Azevedo, Vespeira, Rodrigo, Eduardo Nery, João Vieira, Pablo e Noronha da Costa, em lugar das obras antigas de Almada Negreiros, Eduardo Viana, Bernardo Marques e Stuart Carvalhais. Na esplanada do café, está o bronze de Lagoa Henriques.
Há ainda três últimas referências no roteiro pessoano. O Café Martinho da Arcada, com projeto de autor desconhecido, antes conhecido como Café da Neve, que existe desde 1778. A zona do café é revestida a azulejos brancos, podendo ainda observar-se, junto à entrada do lado esquerdo, a figura de Fernando Pessoa de autoria de Ângelo de Sousa. Aqui o poeta escreveu parte dos seus poemas e, entre eles, «Mensagem».
Em Campo de Ourique, situa-se a sua última morada, na Rua Coelho da Rocha, 16, inaugurada a 30 de Novembro de 1993. A casa foi alterada a pedido da Câmara, com projeto de autoria da arquiteta italiana Daniela Ermano. Estão em exposição permanente várias obras de pintores consagrados como José de Almada Negreiros (Retrato de Fernando Pessoa do Café Irmãos Unidos), Júlio Pomar ou Bartolomeu Cid dos Santos. Regularmente o quarto do poeta é recriado em termos cénicos, por artistas plásticos contemporâneos que apresentam obras de Pessoa ou dos seus heterónimos.
A terceira referência é o Hospital de S. Luís dos Franceses, no Bairro Alto, onde o poeta morreu, a 30 de novembro de 1935, por coincidência no mesmo quarto em que faleceria em 1970 Almada Negreiros…
Guilherme d’Oliveira Martins