Padre Abel Varzim
O Padre Abel Varzim (1902-1964) foi um importante protagonista da história do Chiado e da freguesia da Encarnação. Amigo de António Alçada Baptista e do grupo de “O Tempo e o Modo” e do Centro Nacional de Cultura, era natural de Cristelo, freguesia de Barcelos. Estudou nos Seminários de Braga, tendo-se doutorado em 1934, com distinção, em Ciências Sociais e Políticas, na Universidade de Lovaina (Bélgica), onde conheceu Hergé, sendo o introdutor em Portugal da obra do autor de Tintin. Em 1934, é convidado pelo seu companheiro de escola primária e de seminário, Padre Lopes da Cruz, responsável pela redação do diário “Novidades” e da revista “Renascença”, e orientador da campanha para a criação da Rádio Renascença para, com ele, se dedicar a estas tarefas, sendo assim, um dos fundadores da emissora, que iniciou as suas emissões regulares em janeiro de 1937.
Desde muito cedo, designadamente em Serpa, no Alentejo, e na pastoral operária, a sua preocupação andou pelas áreas dos mais pobres e dos direitos humanos, em especial no mundo do trabalho. Esteve na fundação da Liga Operária Católica, Organismo Especializado da Ação Católica, criado oficialmente em 30 de junho de 1935, e que iniciou a sua atividade em 1936, da qual foi Assistente Geral até 1948. Foi o grande impulsionador do jornal “O Trabalhador”, ao qual se dedicou de alma e coração; este jornal, propriedade dos Organismos Operários da Acão Católica, viria a ser suspenso por comunicação verbal dos «Serviços de Censura» ao chefe da redação, Manuel Alpiarça, em 9 de julho de 1948, quando este ali se deslocou em busca de um “original visado” por aquela entidade, depois de ter aguardado, longamente, pelo mesmo. Esta suspensão ocorreu, goradas as tentativas estatais no sentido de restringirem a sua liberdade. Durante a passagem pela Acão Católica, o Padre Varzim desenvolveu uma intensa atividade, com destaque para a defesa e promoção da justiça social e dos direitos fundamentais.
Foi deputado na Assembleia Nacional na legislatura de 1938/1942, ficando célebre o “Aviso-Prévio” que ali apresentou em 17 de fevereiro de 1939, sobre os Sindicatos Nacionais, em que criticava a organização corporativa, mencionando a ação do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, e nomeadamente a sua ineficácia em muitos aspetos fundamentais. Em consequência, acabou por ser nomeado pároco da freguesia da Encarnação, sofrendo a partir de então perseguições, difamações e mentiras, por defender as vítimas da prostituição e denunciar a autêntica escravatura que aí tinha lugar. O testemunho escrito em “Procissão dos Passos – Uma vivência no Bairro Alto” revela a importância e o alcance da sua ação apostólica. Depois de 1958, solidarizou-se com o Bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes, comungando as dores do seu exílio. Em resultado da trágica campanha de que foi vítima, e apesar dos resultados da sua obra, designadamente na criação de “O Ninho”, que viria a ser dirigido por Inês Fontinha, partiu para a sua terra natal. Abel Varzim que não podia mais com a incompreensão dos homens e acabou por exilar-se em Cristelo, com o desejo de ajudar os pobres e os trabalhadores, seus conterrâneos, fundando uma cooperativa agrícola que lhe sobreviveu.
Morreu em 1964, com 62 anos de idade. O Padre Abel Varzim, tinha da Igreja, segundo disse D. Manuel Martins, que foi Bispo de Setúbal, «a visão de que servir os outros, amar os outros, era o caminho para a evangelização. Esta vertente de serviço para ter uma dimensão evangélica teria de ser realizada segundo o exemplo de Cristo, de tal maneira que nas “instituições de serviço da Igreja” se sintam o coração e a alma, que estão presentes na sua variedade, com a sua solicitude com o seu cuidado com a sua preocupação».
Guilherme d’Oliveira Martins